segunda-feira, 21 de março de 2011

Peguei na Serra da Estrela

Peguei na Serra da Estrela
para serrar uma cadeira
e apanhei um nevão
numa serra de madeira.

Com as linhas dos comboios
bordei um lindo bordado,
quando o comboio passou
o pano ficou rasgado.

Nas ondas do teu cabelo
já pesquei duas pescadas.
Olha para as ondas do mar,
como estão despenteadas.

Guardo o dinheiro no banco,
guardo o banco na cozinha.
Tenho cem contos de fadas,
que grande fortuna a minha.

Com medo que algum ladrão
um dia me vá roubar,
mandei pôr na minha porta

três grossas correntes de ar.

Encomendei um cachorro

naquela pastelaria;

quem havia de dizer

que o maroto me mordia?!

Apanhei uma raposa

no exame e estou feliz:

vejam que lindo casaco

com a sua pele eu fiz.

Entrei numa carruagem

para voltar à minha terra,

enganei-me na estação

e desci na Primavera!


quarta-feira, 2 de março de 2011

Mocho comi!!!!


A Carriça – uma avezinha do bosque – estava muito feliz, no seu ninho, construído por ela num dos ramos mais altos de um carvalho. Sentia-se assim tão feliz porque lhe tinha acabado de nascer uma grande ninhada de filhinhos. Cantava, cantava, para eles, a fim de os adormecer, como qualquer mãe carinhosa.

Enquanto ela estava assim, neste enlevo, passou por ali uma Raposa gulosa que imediatamente sonhou com um bom almoço. Muito matreira dirigiu-se à Carriça, nestes termos:

- Olá, comadre Carriça!

- Estás muito contente, hoje!

- Pudera! Não hei-de estar? Tenho aqui os meus filhinhos junto de mim e canto para os adormecer.

- Aí, é? Então, atira-me para cá um! – respondeu a raposa.

- Atirar um dos meus filhinhos? Nem penses nisso! Tanto que eu gosto deles!!!

- Olha que se não me atiras um, cá para baixo, o meu rabo rabazolão deita o teu carvalho ao chão!!!

A pobre mãe, receando um mal maior, atirou, com grande desgosto do seu coração, um dos carricinhos.

A Raposa imediatamente o engoliu e partiu, nada satisfeita, para outro lugar.

No dia seguinte, à mesma hora, voltou a passar para junto da grande árvore onde se encontrava o ninho da Carriça. A pobre avezinha estava da mesma maneira, a cantar para os filhinhos que ainda tinha.

De novo, a Raposa meteu conversa com a Carriça:

-Então comadre Carriça, continuas contente!!! ...

- Contente?! – respondeu-lhe a Carriça. Não sejas má! Canto, mas estou triste e tu bem sabes porquê!!!

- Ora, ora … Atira-me para cá outro! …

- Outro??? … - respondeu-lhe a Carriça toda indignada.

- Isso é que eu não faço! Vai-te embora, malvada! Não tens coração!

- Olha que o meu rabo rabazolão deita o teu carvalho ao chão!!! – repetiu a raposa para meter medo à Carriça.

Esta coitadinha, mais uma vez pensou que se o carvalho caísse perderia os filhinhos! Então, chorando, atirou-lhe mais um dos carricinhos.

A Raposa, depois de o engolir, desatou a correr e desapareceu por entre as árvores do bosque.

A Carriça ficou a soluçando, soluçando…

Mais tarde, passou por ali o Mocho Sábio que é muito amigo de todas as aves. Ouvindo o choro da Carriça, perguntou-lhe o que se passava. Esta, pobrezinha, explicou-lhe tudo o que a Raposa lhe dissera e como já tinha perdido dois dos seus filhinhos.

O Mocho , então, respondeu à Carriça:

- O quê? E tu acreditaste que a Raposa seria capaz de deitar o carvalho abaixo?!

Ela só diz mentiras! Não tem força para isso!

Se ela voltar a passar por cá e te pedir outro dos teus filhinhos, responde-lhe que experimente a ver se é capaz de deixar cair uma árvore tão alta e forte. Está bem? Faz como te digo.

Assim foi. A Carriça, cheia de coragem, esperou que a raposa voltasse!

Mal ela se aproximou, pensando que teria outro bom almoço, já a Carriça estava preparada para lhe responder.

- Que tens hoje, Carriça, que não cantas?! – perguntou a Raposa com voz matreira.

- Não, não canto! – respondeu a avezinha com voz forte.

- Aí, não?! Então se não cantas atira-me cá para baixo um dos teus bebés!

-Isso é que tudo querias, mas não consegues! – respondeu a Carriça bem do alto da árvore!

- Olha que o meu rabo rabazolão deita o teu carvalho ao chão!!! – respondeu de novo a raposa.

-Então experimenta! Vamos ver se és capaz! - disse o Carriça.

Nesse momento, a Raposa compreendeu que ia ficar mal colocada e, então, disse:

- Estás hoje muito sabida!!! Quem te ensinou isso?!

A Carriça com coragem retorquiu:

- Foi o Mocho Sábio!

- E onde está ele? – perguntou a Raposa.

- Olha, está lá ao fundo em cima da rocha grande!

A Raposa meteu o rabinho entre as pernas e correndo disse " por aí me sigo ".

O Mocho estava a dormir, muito refastelado, em cima da pedra.

A Raposa, sem fazer ruído, abriu a boca e, de um trago, comeu-o, sem o mastigar, sequer.

Mas, como o Mocho sabia muito e era inteligente, dentro do estômago da raposa pôs-se a pensar na forma como haveria de sair de dentro do bicho. Tinha que ser mais esperto que a Raposa!

E foi!

Começou a dizer-lhe:

- Ó Raposa, tu de facto, fizeste uma coisa muito importante! Foste capaz de comer o Mocho Sábio! Todas os bichos e todas as pessoas deveriam saber isso!!! Olha grita bem alto: " Mocho comi! " – de maneira que se oiça lá na aldeia!

A raposa que era vaidosa, fez como o Mocho lhe disse, abriu a boca e gritou:

Mo…o…o…cho comi…i…!

A ave, aproveitando o momento em que a Raposa tinha a boca aberta, saiu-lhe rapidamente da goela, gritando:

- Outro, mas não já a mim!

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

O quadrado convencido

Era uma vez um quadrado que era muito convencido. Vangloriava-se de que sem ele não haveria cubos, pirâmides quadrangulares e muito mais. Mas um dia, um triângulo cansado de tanta presunção foi falar com ele:

− Por que estás sempre com esse ar superior? − perguntou o triângulo.

− Porque sou indispensável. − explicou o quadrado. − Não sei se já reparaste mas, sem mim, no Egipto não haveria pirâmides! És cego?

− Tu é que pareces cego de vaidade! Não te apercebeste que, nós, os triângulos, somos as faces laterais das pirâmides? − questionou o triângulo.

− Sim, mas eu também estou na pirâmide, sou a base. Sem mim não haveria…

− Cala-te, que eu estou farto de te ouvir e sem ti haveria muita coisa! Tu tens que admitir que nas pirâmides estás no chão, na base quero eu dizer, e se tirarem uma fotografia às pirâmides, tu não apareces, pois estás por baixo!

Somos nós que percorremos o mundo, nas fotografias dos turistas.

− Mas toda a gente sabe que eu lá estou, e aliás sem mim…

− Pára! Eu já percebi que não mudas de ideias, mas olha, também há pirâmides triangulares! E esta, hem?

− Ora, ora se cortarem uma parte de mim, podemos ter uma pirâmide, meu caro, e não só, também é possível obter outros sólidos!

− És mesmo convencido! Sofres de “superioridade”?

− Bem, desculpa mas tenho de ir embora − gozou o quadrado. – Tenho uma sessão de autógrafos, sabes como é… Ai não, tu não sabes, aliás como poderias saber? É que eu tenho fãs, muitos fãs. Bye-bye!

Passados alguns dias, o quadrado ficou doente, uma forte constipação fê-lo ficar com os seus quatro ângulos rectos infeccionados, dois pareciam obtusos e os outros dois agudos. Coitado, estava feito num trapézio! Os serviços do quadrado foram então solicitados, pelos alunos de uma escola, numa tarefa de investigação matemática e não tinham quem o pudesse substituir. Foi então organizada uma reunião urgente entre polígonos:

− Como será que vamos substituir o quadrado? − perguntou o chefe que era um experiente icoságono.

− Já sei − exclamou um dos triângulos. − Nós, os triângulos, se nos juntarmos dois a dois formamos um quadrado!

Grita de um canto um preguiçoso triângulo obtusângulo e escaleno, tentando fugir ao trabalho:

− Não podem ser quaisquer triângulos!

Um hexágono irregular, habituado às irritações dos triângulos obtusângulos, compreendendo o que ele quis dizer, explicou melhor a sua ideia:

− Não se esqueçam que só aos triângulos rectângulos é que se pode atribuir

a tarefa de substituir o quadrado.

Timidamente, um losango questionou:

− E pode ser qualquer triângulo rectângulo?

Neste momento todos os triângulos começaram a tentar arranjar par, a encaixarem-se noutros triângulos, mas nem sempre resultava muito bem…

Depois de um grande corrupio, verificou-se que apenas os triângulos rectângulos e isósceles é que podiam transformar-se num quadrado.

E assim foi, foram então escolhidos dois triângulos deste tipo, eleitos entre todos os polígonos presentes na reunião, para substituir o quadrado. E pode dizer-se que a tarefa foi um êxito! Os triângulos rectângulos e isósceles, substituíram o quadrado na perfeição! Até houve quem não se apercebesse da inevitável troca.

Sabendo do que se passou, no dia seguinte, o quadrado foi falar com os triângulos substitutos, já com uma atitude bem diferente.

− Eeeuu…eeu…eu…eu soube que fostes vós, que me substituístes…

− Sim fomos nós, porquê? Vais criticar-nos, é? Achas que não estivemos à altura?

− N…não, antes pelo contrário, eu queria agradecer-vos. Eu fui muito injusto em relação aos triângulos e aos outros polígonos. Durante o período em que estive doente, pude reflectir um pouco, e cheguei à conclusão de que estava cego de presunção até à pontinha dos meus quatro vértices. Acho que aprendi uma lição, nenhum de nós é insubstituível no mundo dos polígonos, qualquer um de nós pode ser obtido por decomposição de outros polígonos, ou construído com a sua união. Agradeço-vos por terem sido solidários comigo, mesmo depois das minhas feias atitudes foram capazes de me substituir, não tentando colher quaisquer dividendos com isso. Isso sim é que é atitudes de polígonos amigos, amigos verdadeiros.

O quadrado foi sincero no seu pedido de desculpas e a verdade é que agora quadrados e triângulos parecem mais unidos. Até há quem os considere os melhores amigos. Nunca mais ninguém teve queixas do quadrado.

Susana Gomes, Histórias com… matemática

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Pitágoras a caminho de Siracusa

Certo dia, estava Pitágoras a passear na linda floresta dos números. Ia a caminho

de Crotona, quando encontrou o Ângulo Recto Mau, que lhe perguntou:

− Onde vais?

Pitágoras respondeu:

− Vou a caminho de Crotona.

− E que levas aí, nessa mochila? − perguntou o Ângulo Recto Mau.

− Um livro de Matemática. Vou estudar as potências com o meu mestre,

Sr. p − respondeu ele.

− Agora já não vais. Vou comer-te … tens um ar bastante apetitoso e matemático. −disse o Ângulo Recto Mau.

− Isso é que não vais. Vou transformar-te num triângulo rectângulo. – disse o matemático, pegando na sua espada d’ a¨o (raiz quadrada de aço).

Depois de uma árdua luta entre ambos, Pitágoras deu um golpe sobre o

Ângulo Recto e quebrou um dos segmentos de recta, conseguindo transformá-

-lo num triângulo rectângulo.

− Assim nunca mais comerás ninguém! − exclamou o estudioso.

Pitágoras continuou o seu caminho para Crotona, levando consigo o Triângulo

Rectângulo. Parou para descansar um pouco e comer uns bolos de ÷ que tinha preparado em casa da sua mãe, pois tinha lá ido passar o fim-de-semana.

− Que delícia estes bolos! A minha mãe tem cá umas receitas! – exclamou Pitágoras, enquanto olhava para os maravilhosos bolos.

Estava à sombra de uma árvore chamada poligoneira, que tinha como nome científico fructus poligonalis. Trepou até à copa, mas apenas apanhou um pentágono, um heptágono, um eneágono e um gigágono. Ficou admirado como um polígono podia ter tantos lados:

− Meu Deus! Aqui se vê quão bela é a matemática! Este poligófruto deve ter um bilião de lados, sendo assim um gigágono!...

Apanhados estes frutos, Pitágoras prosseguiu o seu caminho até que chegou

a Crotona, uma cidade grande, barulhenta, mas de grande valor matemático.

“Ding dong” fez o sino que servia de campainha da casa do Sr. p.

− Boa tarde, jovem. Preparado para mais uma aula de Matemática? – perguntou o Sr. p .

− Claro. Para ter uma aula de matemática, estou sempre pronto. – respondeu Pitágoras. − Hoje vamos dar as potências, não é? Pesquisei um pouco sobre o assunto e parece-me interessante.

− E é, meu jovem. Servem para representar multiplicações onde o factor se repete. Mas entremos, que eu já te explico em pormenor.

E Pitágoras entrou na humilde casa do seu mestre e começou a aula de matemática. Pitágoras ficou tão entusiasmado, que se servia de tudo para fazer potências. Acabada a explicação, agradeceu ao Sr. p.

Quando ia a caminho de casa, em Siracusa, sentiu o Triângulo Rectângulo mexer-se dentro da sua mochila.

− Que estás a fazer? − perguntou ele.

− Estava a ler o teu livro de matemática. É bastante interessante. – respondeu o Triângulo Rectângulo, que estava mais interessado no livro do que na sua conversa com o novo amigo.

− Tive uma ideia. Posso fazer uma potência com o comprimento dos teus lados? –

perguntou Pitágoras com ar amigável.

− Está bem. − respondeu o Triângulo Rectângulo com ar pouco importado.

O matemático tirou um lápis e um papel da sua mochila e começou a elevar a medida dos lados do Triângulo Rectângulo ao quadrado e, de repente deu um berro:

− Eureka! Eureka!

− O quê?! Eureka?! O que é isso?! − perguntou com ar de admiração o

Triângulo Rectângulo.

− Quem disse isto foi Arquimedes, quando descobriu o Princípio da Hidrostática.

Esta palavra significa “descobri”. − respondeu o estudioso.

− Mas, afinal, descobriste o quê? − perguntou o Triângulo Rectângulo.

− Se somarmos o quadrado do comprimento dos dois lados do teu ângulo

recto é igual ao quadrado do restante lado. − explicou Pitágoras.

− Podias simplificar isso, dando nomes aos lados? − aconselhou o amigo.

− Já sei, os lados que constituem o ângulo recto vão-se chamar Catetos “a”

e “b”, o nome do meu papagaio e o outro lado vai ser a Hipotenusa, o nome da

minha gata. − disse Pitágoras.

− A mim parece-me bem. Então e não há uma fórmula? Todos os teoremas têm uma fórmula. − disse o Triângulo Rectângulo, quase como picando o seu amigo matemático.

− Então, deixa-me cá ver… Já sei: H2 = Ca

2 + Cb

2. − respondeu Pitágoras.

Entretanto, apareceram os netos do matemático:

− Olá avô, que estás a fazer?

− Acabei de fazer uma descoberta. − respondeu o avô muito vaidoso.

Os netos do estudioso adoravam matemática e pediram-lhe empolgados:

− Conta-nos a tua descoberta.

− Está bem! Conto-vos a caminho de Siracusa. − respondeu o avô.

Eles partiram, juntamente com o Triângulo Rectângulo, que foi viver para casa de Pitágoras e este lá foi explicando o teorema aos netos, e foi assim que surgiu a lengalenga: “A caminho de Siracusa disse Pitágoras aos seus netos, o quadrado da Hipotenusa é igual à soma do quadrado dos Catetos”.

Gustavo Marques, Histórias com... matemática