- Escutem bem a vossa mãe. Hoje é o dia da feira na vila. Para que possamos saborear um bom chocolate e belas tortas de fruta, preciso de dar uma saltada à Mercearia Faz-Tudo e comprar géneros apropriados. Também aproveitarei para fazer uma visita à tia Chiba e, por isso, é possível que só possa regressar muito tarde a casa. Portanto escutem com atenção! Abram-me bem os olhos e arrebitem as vossas orelhas enquanto estiver ausente. Ouçam agora: Mestre Lobo devora os cabritos que não andem com muita cautela e, por muito que coma e devore, nunca tem a goela satisfeita! Receio bem que tente chamar-vos lá para fora, para cravar os dentes afiados em vocês. Também não abram a porta a ninguém, mal eu tenha saído de casa. A ninguém, ouviram bem?
- Sim, mamã!-disseram os sete cabritinhos ao mesmo tempo.
Então um deles, mais atinado, perguntou:
- Mas quando regressar como é que poderemos ter a certeza de que é, de facto, a mãezinha?
A mãe Cabra sossegou-os:
- Quando regressar da vila, passarei a minha pata branca pela fresta do postigo da porta e assim podereis certificar-vos de que sou eu.
E a comadre Cabra lá foi às suas compras.
Mestre Lobo, que passava nas proximidades, notou a saída da comadre Cabra, e pensou:
- Desta vez, meus cabritinhos, é que não me escapais.
Com medo de assustar os cabritinhos se lhes uivasse na sua voz forte, pensou na melhor forma de os iludir. Porque não tomar umas colheres de açúcar, como fazem os cantores quando estão roucos? Resolveu então ir pedir um conselho à Mercearia Faz-Tudo. É claro que o merceeiro, ao ver um lobo tão corpulento, ficou aterrado e boquiaberto, enquanto o marçano tratou logo de se esconder atrás do balcão. Mestre Lobo pediu polidamente se lhe podiam vender uns ovos para uma gemada. Para se ver livre de cliente tão perigoso, o merceeiro ofereceu-lhe meia dúzia de ovos e um pouco de açúcar. O lobo devorou a gemada de um trago e tratou de regressar.
Mal chegou junto da casa dos cabritinhos, escondeu-se atrás dos arbustos, aproximou-se cautelosamente da porta e, com a sua grande pata, bateu três vezes:
Truz... Truz... Truz!
Dissimulando a sua voz forte, suavizada pela gemada, latiu:
- Cabritinhos, abri a porta à vossa mãesinha, que já voltou da vila. Depressa, pois o meu cesto está cheio de pastéis de massa folhada, bolos e doces de creme. Está tão pesado, que até me custa a aguentar com ele às costas. Então... abri!
Os cabritos ficaram admirados por a mãe já estar de volta, quando os tinha avisado de que se demorava, e levaram certo tempo a responder. Então, mestre Lobo voltou a repetir, impaciente, com mais rudeza:
- Então, abram depressa! Abram a porta... mas abram!
Ouvindo esta voz que eles não conheciam, o mais ajuizado dos cabritos sempre arriscou finalmente:
- Decerto, vamos abrir... Mas, para o poder fazer, queremos, primeiramente, a tua patinha ver.
Mestre Lobo, remirando as suas escuras patas, compreendeu ser inútil insistir. E retirou-se todo triste. Mas durante o caminho pensou:
- Tenho de descobrir uma maneira de entrar. Ora vejamos... que hei-de fazer? ...
Ah! Eis a solução: vou visitar o mestre padeiro e untar as minhas patas com a massa do pão, de bela farinha branca. As patas ficarão claras e, sem receio, já poderei mostrá-las aos cabritinhos.
E o padeiro, que apanhou um grande susto ao vê-lo, untou-lhe a pata como ele pediu.
Chegado à soleira da porta dos cabritinhos voltou a bater.
Truz... Truz... Truz!
- Abri, meus cabritinhos queridos. É a vossa mãesinha que acaba de voltar da vila. Abri depressa, abri!
- Decerto vamos abrir... Mas queremos primeiro a tua patinha ver.E o lobo tratou logo de passar a sua pata pelo postigo. Os cabritinhos, julgando ser de facto a sua mãe que chegava, abriram o ferrolho. O lobo empertigou-se todo e cresceu-lhe água na boca ao avistar os cabritinhos. Estes, ao verem uma grande língua vermelha sair do focinho do lobo, logo começaram a balir, atropelando-se uns aos outros, pernas para que vos quero, na ânsia de se salvarem. Procuraram esconder-se debaixo das camas, armários, mesas e outros móveis. Mas o malvado lobo encontrou-os e, duma assentada, devorou-os de uma só vez, à excepção do mais novinho que se tinha escondido na caixa de madeira do relógio alto.
Depois disto, mestre Lobo tratou de dormir uma sesta sob a macieira grande. O cabritinho mais novo tremia de medo, enquanto aguardava o regresso de sua mãe. Logo que mãe Cabra entrou finalmente em casa, este, lavado em lágrimas, contou o que tinha acontecido aos irmãos. Ao ouvir o triste relato da desgraça que acontecera, a comadre Cabra ia-se desfazendo em pranto de aflição e desespero: era necessário salvar o mais depressa possível os seus queridos cabritinhos. Pegou na grande tesoura de poda do jardineiro e aproximou-se resolutamente de mestre Lobo que ressonava a plenos pulmões, à sombra duma grande macieira. Dum golpe rápido rasgou o ventre do lobo, donde saíram saltitando, um a um, os seus pobres cabritinhos. Ainda estavam muito assustados mas, como o lobo os tinha engolido sem mastigar, só tinham sofrido um susto. O mais depressa que puderam ajudaram a mãe Cabra a encher de grandes pedras o ventre enorme do lobo, e depois trataram de correr para casa.
Logo que mestre Lobo acordou, sentiu-se pesado e com uma sede horrível. Lá se arrastou até ao poço do jardim para beber mais à vontade. Aproximou-se da borda e debruçou-se para meter a língua nessa água fresquinha. Mas eis que, no ventre, o peso das pedras lhe fez perder o equilíbrio e zás... caiu no poço. Arrastado para o fundo, logo morreu afogado, vítima da sua gulosice.
A comadre cabra e os seus cabritinhos começaram a dançar em redor do poço. Os vizinhos vieram felicitá-los e toda a gente estava muito satisfeita por se verem livres do lobo feroz.
Contos de Grimm
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